domingo, 30 de março de 2014

O Livro das Bem-Aventuranças - parte 1

Tema 25

O Livro das Bem-Aventuranças - parte 1

Dr. José Carlos Ramos
Março, 2014

            Os dicionários definem bem-aventurança em termos de felicidade absoluta e perfeita. Tendo em conta que Deus, em sua amorável solicitude por Suas criaturas, almeja que todos sejam autenticamente felizes, podemos considerar a Bíblia toda como um livro de bem-aventuranças. Ela contém as orientações divinas que, uma vez seguidas, tornar-nos-ão felizes nesta vida, e nos assegurarão a posse da vida eterna em Seu reino, onde jamais penetrarão a dor e a tristeza. “Bem-aventurado aquele que teme ao Senhor e anda nos Seus caminhos... feliz serás, e tudo te irá bem” (Sl 128:1, 2).

O Caráter Escatológico das Bem-Aventuranças do Novo Testamento

             A palavra grega makários, que significa bem-aventurado, feliz, é empregada umas 50 vezes pelos escritores do Novo Testamento, a maioria em alusão a alguém que se submete a Deus e aceita as provisões da redenção em Cristo. Revestem-se, portanto, de um colorido escatológico, isto é, relacionado com a manifestação final dos propósitos divinos de salvação.
Nada pode conferir maior senso de felicidade a um pecador que a consciência de ter sido perdoado por Deus e aceito por Ele como filho amado e herdeiro dos bens eternos. Não há uma situação mais ditosa, e tal experiência compensa qualquer dificuldade ou tribulação que porventura tenhamos de enfrentar na qualidade de seguidores de Cristo. Paulo afirmou com toda a confiança: “para mim tenho por certo que os sofrimentos do tempo presente não são para comparar com a glória por vir a ser revelada em nós” (Rm 8:18).
            Os Evangelhos de Mateus e Lucas se destacam no emprego de makários com mais da metade das referências de todo o Novo Testamento. Ambos os evangelistas registram o célebre sermão da montanha proferido por Jesus no princípio do Seu ministério. Este sermão é, de fato, a carta magna do reino de Jesus.
A versão de Mateus é a mais conhecida. Quem já não se emocionou lendo ou ouvindo aquelas abençoadas declarações que Jesus proferiu na abertura do Seu sermão? “Bem-aventurados os humildes de espírito, porque deles é o reino dos céus. Bem-aventurado os que choram, porque serão consolados. Bem-aventurados os mansos, porque herdarão a terra. Bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, porque serão fartos. Bem-aventurado os misericordiosos, porque alcançarão misericórdia. Bem-aventurado os limpos de coração, porque verão a Deus. Bem-aventurado os pacificadores, porque serão chamados filhos de Deus. Bem-aventurados os perseguidos por causa da justiça, porque deles é o reino dos céus. Bem-aventurados sois quando, por Minha causa, vos injuriarem e perseguirem e, mentindo, disserem todo o mal contra vós. Regozijai-vos e exultai, porque é grande o vosso galardão nos céus” (Mt 5:1-12).

Apocalipse – o Livro das Bem-Aventuranças

O Apocalipse registra 7 vezes a palavra makários, quase todas na segunda metade do livro:

·    Bem-aventurados aqueles que leem e aqueles que ouvem as palavras da profecia e guardam as coisas nela escritas, pois o tempo está próximo (1:3).
·         Bem-aventurados os mortos que desde agora morrem no Senhor. Sim, diz o Espírito, para que descansem das suas fadigas, pois as suas obras os acompanham (14:13).
·      Bem-aventurado aquele que vigia e guarda as suas vestes para não andar nu, e não se veja a sua vergonha (16:15).
·         Bem-aventurados aqueles que são chamados para a ceia das bodas do Cordeiro (19:9).
·     Bem-aventurado e santo é aquele que tem parte na primeira ressurreição; sobre esses a segunda morte não tem autoridade; pelo contrário, serão sacerdotes de Deus e de Cristo, e reinarão com Ele os mil anos (20:6).
·         Bem-aventurado aquele que guarda as palavras da profecia deste livro (22:7)
·      Bem-aventurados aqueles que lavam as suas vestiduras, para que lhes assista o direito à árvore da vida, e entrem pela cidade pelas portas (22:14)

O número 7 sugere perfeição, plenitude, e o termo é empregado com uma ênfase que nenhuma outra parte do Novo Testamento poderia oferecer com tanta propriedade. Se é verdade que o emprego do termo no Novo Testamento apresenta um colorido escatológico, no Apocalipse, então, ele se volta inteiramente à consumação final. As bem-aventuranças apocalípticas são proferidas na perspectiva do que Deus realizou em nosso favor na pessoa de Jesus, do que Ele está fazendo agora, e daquilo que virá depois, quando a História tiver alcançado o seu grande clímax e o pecado sido extirpado definitivamente, abrindo espaço para a implantação do reino divino no mundo.
            Acho que isto nos autoriza a considerar o Apocalipse o livro das bem-aventuranças por excelência. Em algumas mentes, infelizmente, predomina a ideia de que o Apocalipse não é mais que um livro de maus presságios, cujos quadros fatídicos exibem o desfile de figuras enigmáticas comissionadas por Deus para cumprir uma terrível tarefa de destruição no mundo. Nada corresponderia melhor à irrealidade. Para muitos, é verdade, a simples palavra apocalipse desperta incerteza e temor. Mas a intranquilidade é fruto do pecado e não da ação divina, a qual visa apenas salvar. Tudo o que Apocalipse revela de medonho e triste tem a ver essencialmente com as consequências do pecado.
Naturalmente, o tratamento de Deus com toda essa problemática pode exigir uma atitude drástica, tal como um cirurgião à vezes se vê na necessidade de, para benefício do corpo, amputar um órgão gangrenado. As ações de Deus objetivam o bem maior da erradicação completa do pecado com todas as suas implicações. O pecado sempre foi e sempre será um fator de degradação e miséria, e quanto mais cedo desaparecer melhor. O que Deus mais almeja é conduzir a Terra ao seu estado original de perfeição. E a cirurgia, naturalmente, tem o seu lado doloroso. Jesus mesmo se referiu ao “princípio das dores” (Mt 24:8) ao falar dos sinais de Sua volta e do fim do mundo.
Estes mesmos sinais, entretanto, são um fator de ânimo e conforto para aqueles que almejam o reino de Deus (Lc 21:28). É apenas para aqueles que desprezam a graça divina e escolhem a senda do mal e da perdição, que o ato divino será de efeito desastroso. E este não é o teor apenas do Apocalipse. Toda a Bíblia revela que o futuro é muito sombrio para blasfemadores, hipócritas e infiéis.

Assim, para os que amam a Deus, o Apocalipse não é menos que um livro de bem-aventuranças. Meditemos um pouco nelas e ouçamos a voz de Deus assegurando uma vez mais que só temos a ganhar quando damos ouvidos à Sua voz e nos dispomos a fazer a Sua vontade.